
Ensaio Dacia Spring: eletrificação acessível
23/03/2022A Dacia tem uma filosofia bem definida e, na mobilidade 100% elétrica, não se desviou dela. Com um preço abaixo dos 20 mil euros, o Spring permite rodar com zero emissões a um preço acessível. Mas… para isso é preciso fazer algumas concessões. Porque, milagres… não se fazem! Este ensaio ao Dacia Spring revela e explica tudo.
- A Favor – Preço, Consumo energético, Simplicidade, Facilidade de condução
- Contra – Limitado à cidade, carga lenta, volante sem regulação

Não sei se se sabem qual é a base deste Dacia Spring. Não? Lembram de um Renault desenhado para a Índia em 2015 e que a casa francesa jurou que nunca chegaria à Europa? Isto porque era um carro para os mercados emergentes com cidades densamente povoadas. Falo de um modelo de baixo preço, rudimentar que fez a alegria dos indianos. Porque era barato e permitiu que muitos tivessem acesso a um veículo fechado e com quatro rodas.
Mais tarde, a mobilidade 100% elétrica escancarou a porta ao K-ZE, uma versão elétrica do Kwid e destinado aos chineses. Após palmilhar milhares de quilómetros, o carro que não viria o sol nascer a ocidente… na versão elétrica… desembarca no Velho Continente.
Ou seja, o Dacia Spring é um Renault K-ZE, adaptado para o mercado europeu. Nesse sentido, não é um modelo romeno. É chinês como muitos outros automóveis elétricos que circulam na Europa de marcas europeias.
Chinês ou não, este Spring tem como cliente alvo… você! Sim, você o cliente particular que está cada vez mais seduzido pela mobilidade elétrica e fica escandalizado com os preços. Se pretende um carro semelhante ao seu VW Golf, Mercedes Classe A, terá de se virar para outro lado.
O Spring é para quem quer um carro barato, com baixos custos de utilização e cujo desejo de ajudar no combate às alterações climáticas esbarra no tamanho da carteira. Todavia, terá de perceber que o Dacia Spring é barato à custa do sacrifício de algumas coisas.

Então, mas não andavam os construtores a “fugir” dos citadinos?
Andavam e andam. E nas versões 100% elétricas, apenas a Volkswagen estava presente com os VW Up, Skoda Citigo e Seat Mii. O grupo alemão já retirou a ficha e os três modelos desapareceram dos catálogos.
A chegada do Spring veio animar o segmento e o sucesso do modelo acaba por justificar esta incursão pelo mercado do grupo Renault. Custos baixos e uma proposta barata em termos de modelos elétricos. Mas… é sempre uma aposta de risco, pois apesar de barato como modelo elétrico, é mais caro que um citadino a gasolina.

Explica, então, o que é este Dacia Spring
Em primeiro lugar, dizer que o Spring parece uma… miniatura! O formato SUV é enganador, pois o carro tem apenas 3,73 metros de comprimento. Pequenino e… levezinho. Na báscula acusa 1.020 quilogramas. Um valor excelente para um modelo 100% elétrico.
Porém, a Dacia indica que o peso máximo autorizado é de 1286 quilos. Ora, sendo um carro homologado para quatro passageiros, terão todos de ser levezinhos para que perfaçam 266 quilos…
Por outro lado, na bagageira, há 290 litros de capacidade que podem ser “esticados” até aos 620 litros com o rebatimento do banco traseiro. Uma concessão: não há repartição das costas do banco. Ou rebate tudo ou nada!
O estilo é… o que é. Agradável à vista mesmo que pareça liliputiano perto de outros modelos de segmentos acima.

E como é o Dacia Spring no interior?
O Spring é um tração dianteira e é lá que está o pequeno motor elétrico, ficando tudo o resto por baixo do capô onde estaria o motor de combustão interna. Por via disso, as baterias estão colocadas por baixo do banco traseiro.
Quanto ao habitáculo… coragem! Aqui é evidente a origem do Spring. Veio de oriente, de mercados onde a qualidade do interior é absolutamente secundário. Os materiais utilizados são muito fracos, com plásticos duros e rugosos. As portas são muito leves e fazem um ruído horrível quando as fechamos.
Simultaneamente, a posição de condução foi pensada para pessoas de percentil 65 ou inferior. Não havendo regulação do volante nem do banco em altura, mais uma calha de regulação do banco curta, a posição de condução acaba por ser deficitária e incómoda em trajetos mais longos.

Dacia Spring rima com simplicidade
A simplicidade do Spring acaba por ser… refrescante! O Spring tem instrumentação digital, mas não tem menus rebuscados, comandos sensíveis ao toque. Enfim, nada daquilo que hoje nos irrita em muitos carros.
Os comandos da climatização são… “clássicos” e o computador de bordo é controlado por um botãozinho de pressão colocado a meio do painel de instrumentos.
Da mesma forma, para colocar o carro a andar recorremos ao bom e velho canhão com chave e, depois, rodar o botão que está, sozinho, na consola central. Que tem D, N e R. Ou seja, avançar, neutro e marcha atrás. O travão de mão também é clássico.
Os forros das portas não têm mais que os puxadores, pois os comandos dos vidros elétricos estão debaixo do ecrã do sistema de info entretenimento.
Que só existe na versão Comfort Plus, alvo deste ensaio. Mas a Dacia utiliza uma versão antiga que, na época, já não era dos mais modernos. Tem um ponto a favor: funciona e faz aquilo que é suposto.
O Bluetooth e o Rádio DAb+ é de série, mas só há dois altifalantes pelo que o som… não é fantástico. Porém, funciona! E porque o carro é elétrico, existe uma aplicação que permite vigiar à distância o carregamento da bateria. Se o carro estiver ligado a um carregador ou a uma tomada elétrica, o utilizador pode, á distância, ligar a climatização.
Estão disponíveis os sistemas Android Auto e Apple CarPlay. E o ecrã tem 7 polegadas com navegação. Ou seja, neste caso, o equipamento até vai mais além do que se esperava.

E como é a motorização do Spring?
Uma vez mais… simplicidade! O motor tem, somente, 45 CV e a bateria (feita pela Sunwoda, empresa… chinesa) tem 27,4 kWh. Sendo refrigerada, apenas, por ar, é muito mais sensível às variações do ambiente. Exatamente por isso, não tem carga, verdadeiramente, rápida. O limite são os 30 kW e para ter um carregador de corrente contínua terá de desembolsar mais de 250 euros. E só se comprar o Comfort Plus!
Contas feitas, para carregar o Spring com o carregador interno de 6,6 kW são precisas cinco horas para ter 100% da carga da bateria. Isto numa “wallbox” ou num carregador público de 7,4 kW. Numa tomada trifásica serão precisas 9 horas.

E em utilização? O Spring deve ser complicado!
Por acaso… não! Dentro da sua simplicidade, o Spring tem soluções clássicas com sistema McPherson e eixo de torção atrás. Tem uma altura ao solo pouco normal – mas como é um carro vendido na Índia onde as estradas são péssimas, acaba por ser normal – e é vendido com jantes de 14 polegadas e pneus estreitos com grande parede lateral.
O amortecimento das irregularidades da estrada é excelente! E como não há mecânica à frente, os engenheiros puderam aumentar o curso da suspensão dianteira e oferecer um diâmetro de viragem curto à imagem do que sucede com o Renault Twingo. E esta é uma vantagem na cidade, o ambiente de eleição do Spring.
Finalmente, dizer que a tomada de carregamento está situada por trás da grelha dianteira. Esta é aberta por uma patilha que está lado a lado com a abertura do capô.

É possível fazer viagens para fora das cidades?
A maneabilidade, agilidade e capacidade de andar pelos locais mais recônditos de cidades como Lisboa (a largura de 1,6 metros ajuda), contrasta com a pouca potência do motor elétrico. Por isso, percursos suburbanos são perfeitamente possíveis, fora disso mais complicados.
Ou seja, até aos 70 km/h, o binário de 125 Nm está sempre disponível e com capacidade de retomada de aceleração que impressionam. Por outro lado, quando o ritmo aumenta, o Spring passa a estar menos à vontade.
Enfim, não há milagres: 45 CV e 125 Nm de binário não permitem mais que 19,1 segundos dos 0-100 km/h e uma velocidade máxima de 125 km/h. Ligeiramente melhor que… o Renault 4L dos anos 70 e 80 do século passado.
Há um modo Eco que limita, ainda mais, as performances. O Spring em modo Eco não permite mais de 100 Km/h de velocidade máxima. Acha pouco? Em cidade é mais que suficiente!
Este modo Eco permite consumos de 11,4 kWh/100 km (sem o modo Eco faz 13,4 kWh/100 km), o que faz dele o modelo 100% elétrico mais económico do mercado. Contas feitas, a autonomia supera os 200 km. Mas tenha atenção que em zonas muito frias poderá ver esta cifra baixar significativamente.
E aqui está mais um compromisso do Spring. Com carregamento pouco rápido e uma bateria muito sensível ao ambiente, a utilização do Spring poderia parecer diminuída. Mas como é possível com uma hora de carregamento recuperar uma boa autonomia, tudo se torna mais simples.

O que é que eu penso deste Dacia Spring?
Com um preço abaixo dos 19 mil euros, este é, verdadeiramente, o modelo 100% elétrico mais barato que é possível comprar. É um “carrinho” citadino ágil e divertido. Mas para ter este preço, há que aceitar algumas coisas menos boas. É um elétrico da geração anterior. Esta afirmação é suportada pela autonomia demasiado sensível ao estado do tempo e pela ausência de recarga verdadeiramente rápida. Porém, a grande verdade, é que excetuando esses compromissos, pouco há a criticar no Spring! Ou seja, em cidade ele oferece total satisfação e isso é o objetivo deste Dacia. Já se o seu pensamento está em ver o Spring como substituto do Sandero… esqueça lá isso.
Ficha técnica – Motor: elétrico síncrono com íman permanente; Potência (CV): 45; Binário máximo (Nm):125; Transmissão: dianteira, caixa de relação única; Direção: Pinhão e cremalheira assistida eletricamente; Suspensão (ft/tr): independente tipo McPherson/eixo de torção; Travões (fr/tr): Discos ventilados/tambores; Prestações e consumos Aceleração 0-100 km/h (s): 19,1; Velocidade máxima (km/h): 125; Consumos (kWh/100 km): 11,4 e 13,4; Dimensões e pesos Comp./Lar./Alt. (mm): 3734/1579/1516; Distância entre eixos (mm): 2423; Largura de vias (fr/tr mm): nd/nd; Peso (kg): 1020; Capacidade da bagageira (l): 290/620; Capacidade da bateria (kWh): 27,4; Pneus (fr/tr): 165/70 R14; Preço da versão ensaiada (Euros): 18.999